Introdução
O artigo a seguir é uma continuação de um primeiro artigo, que serviu como uma base para quem nunca teve contato com alguns tópicos introdutórios de estatística. Porém, é possível entender o texto que segue caso o leitor já esteja familiarizado com o porquê de utilizar medidas de tendência central e de dispersão e como retorno esperado e risco de um ativo são, respectivamente, a média e variância de uma amostra dos retornos.
A seguir será apresentado ao leitor o retorno esperado, o risco e a relação entre os dois em uma carteira de ativos. Além disso, será explicado como otimizar e visualizar essa relação através da Teoria Moderna do Portfólio.
Retorno esperado de uma carteira
Dada uma carteira com n ativos, é possível obter o seu retorno esperado como um todo, dado a porcentagem e o retorno esperado de cada ativo que a compõe. A fórmula é simplesmente uma média dos retornos esperados ponderada pelo peso dos ativos:
A intuição por trás é simples: espera-se que uma carteira de ativos tenha como retorno a soma dos retornos de cada ativo, porém, é de extrema importância considerar a proporção dos ativos. Uma carteira onde 90% é composta por um ativo A e 10% pelo ativo B é claramente diferente de uma carteira que contém 50% do ativo A e 50% do B, embora os ativos sejam os mesmos.
De forma menos intuitiva, é possível calcular o retorno de uma carteira por matrizes também. Dadas as matrizes [0]:
Risco de uma carteira
Seguindo a lógica do retorno esperado de uma carteira, para calcular o risco de uma carteira basta somar os riscos de cada ativo ponderados pela porcentagem que fazem parte no portfólio? Em partes sim, porém é necessário considerar mais um fator: a covariância entre os ativos.
Suponha dois investidores: um possui 50% em uma ação alfa do setor de saúde e 50% em uma ação beta do setor de comunicações. O outro possui 50% da mesma ação alfa e 50% em uma ação gama do setor de saúde também. A ação beta se comparada com a gama tem uma variância dos retornos maiores, ou seja, um risco maior.
O risco da carteira do segundo investidor a um primeiro momento pode parecer menor se calculada a média do risco dos ativos ponderado pelos pesos de cada um. Porém, supondo que o setor de saúde sofra de forma isolada impactos negativos, o segundo investidor estaria sujeito a perdas maiores que o primeiro. Setores na economia sofrem esse risco através de diversos aspectos:
- Políticas Públicas: criação de uma nova lei ou impostos que afetam a produção no setor.
- Tecnológico: pela própria lógica capitalista, novas tecnologias tornam produtos de um setor obsoletos. [1]
- Crises Econômicas: mesmo que afetem a economia como um todo, podem ter impactos maiores em certos setores.
O risco que um investidor tem ao manter ativos de mesmo setor é análogo à frase: “não coloque todos os ovos em uma única cesta”. Isso é traduzido matematicamente utilizando a covariância entre os retornos dos ativos. Junto a isso, considerando a média ponderada da variância (ou desvio padrão) dos ativos, chega-se a fórmula do risco de uma carteira:
Mas, afinal, o que é a covariância entre os retornos dos ativos? A covariância é uma medida que fornece um grau de quanto duas variáveis se associam entre si. Portanto, quanto maior a covariância entre dois ativos, maior o risco, pois indica que os retornos se comportam de forma parecida. Supondo um ativo A e um ativo B que apresentam uma covariância alta, caso um acontecimento ocasione a queda do preço de A, existem grandes chances do preço de B sofrer com uma queda proporcional a covariância que os dois ativos têm entre si. Normalmente, ativos com covariância alta entre si serão ativos de mesmo setor. Para calcular essa medida, utiliza-se a fórmula a seguir:
Para calcular o risco de uma carteira por matrizes [0]:
Risco e retorno esperado
Na Teoria de Markowitz existe a premissa de que os investidores são racionais e têm como essência aversão ao risco. Imagine que um investidor têm quatro ativos possíveis para investir:
Comparando o ativo A com o B, ambos têm o mesmo risco, porém A apresenta um retorno maior. Portanto, não faz sentido investir no ativo B já que proporciona o mesmo risco e retorno menor que A. Seguindo a mesma lógica, o investidor prefere o ativo C se comparado com o D. É intuitivo também que o investidor prefere menor risco ao mesmo nível de retorno esperado. Assim, B exclui o ativo D, embora ambos já foram descartados. Portanto, restando A e C, qual o investidor deve escolher? Isso irá depender do seu perfil, já que embora C possui maior risco, apresenta maior retorno. E embora A apresente menor retorno, apresenta menor risco.
Fronteira eficiente de Markowitz
No tópico anterior, foi exposta a forma que investidores escolhem ativos quando comparado a outros. Porém isso também é utilizado para carteiras que possuem os mesmos ativos, com pesos diferentes. Supondo um portfólio com 5 ativos onde cada um representa 20% dele, a carteira terá um risco X e retorno esperado Y. Porém esse portfólio pode ser composto de 80% de um ativo e 5% de cada um restante e assim, tendo um risco A e retorno B. E através dos riscos X e A e retornos Y e B, o investidor deve descartar a carteira que apresentar o retorno menor e risco maior ou igual, ou, risco maior e retorno menor ou igual.
Porém, é uma tarefa que não é viável de ser feita manualmente já que existem diversas combinações de pesos. A seguir estão representadas cerca de 100.000 carteiras compostas pelos cinco ativos com maior participação na carteira teórica do IBrX 100 válida para 04/09/20 [3]. Os ativos são VALE3, B3SA3, ITUB4, PETR4 e BBDC4. Cada ponto no gráfico representa o risco e retorno esperado de uma carteira que possui esses cinco ativos, porém com pesos diferentes [4].
Essas são diversas carteiras possíveis, contudo em um primeiro momento, a maneira de analisar o risco e retorno como no tópico anterior ainda não parece simples. Porém, a linha azul em volta dos pontos, é justamente essa análise. Cada ponto nessa curva representa a carteira com o maior retorno possível para cada nível de risco. E justamente essa linha azul que é chamada de Fronteira Eficiente de Markowitz.
Notas
[0] Matrizes são mais vantajosas em dois aspectos quando se calcula risco e retorno de uma carteira com diversos ativos: se calculados manualmente, a matriz é uma forma melhor de visualização e cálculo; se calculados utilizando alguma linguagem de programação, armazenar uma matriz ao invés de diversas variáveis permite um cálculo mais rápido.
[1] Esse é o conceito de “destruição criadora” desenvolvido pelo economista Joseph Schumpeter apresentado no livro a seguir: SCHUMPETER, J. Capitalismo, Socialismo e Democracia. Editora UNESP, 2017. 1ª edição.
[2] Quando i=j, Covi,j=variância de i=variância de j.
[3] IBrX é uma carteira teórica composta pelos 100 ativos de maior negociabilidade na bolsa brasileira.
[4] Os dados utilizados referentes aos ativos são de 03/09/2019 a 03/09/2020.